Esferovite, latas de refrigerante e ventoinhas de computadores que já não são usados. São estes os “ingredientes” duma solução que está a ser criada na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) por uma investigadora e doutoranda em Ciências Químicas e Biológicas e que se propõe a ser um desidratador de fruta mais amigo do ambiente.
A solução tem o nome de “Sun2Dry” e utiliza energia renovável, usando da sustentabilidade como um dos principais chavões do projeto: “Trata-se de um protótipo para uso doméstico, construído com 95% de material reciclado e que utiliza 100% de energia solar. É de fácil portabilidade e precisa apenas de um espaço exterior, como uma varanda, para que possa ser utilizado por qualquer pessoa”, diz a investigadora Lisete Fernandes, responsável pelo projeto, numa nota enviada à imprensa, sublinhando que o trabalho “está altamente comprometido com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da ONU, nomeadamente no que toca aos objetivos de erradicar a fome, energias renováveis e acessíveis, produção e consumo sustentáveis”.
O protótipo reaproveita caixas de esferovite utilizadas normalmente para peixe, sendo que a investigadora as desinfeta e junta-lhes as latas de refrigerante, pintando toda a caixa de preto para garantir que o calor é retido. No interior da caixa, são instaladas ventoinhas de computador que funcionam graças a um painel solar exterior. À exceção de alguns dos materiais utilizados (tampa de vidro, suportes e rede de prateleiras), todos os materiais utilizados na construção do protótipo são reciclados. O equipamento está a ser testado para a desidratação de maçãs “Golden Delicious” e “Royal Gala”, sendo que é colocado no terraço dum dos edifícios da academia transmontana entre quatro a seis horas, quando a temperatura exterior é de 30º. Nestas condições, dentro do “Sun2Dry”, as temperaturas podem chegar aos 70º, permitindo obter um snack crocante que se conserva até um mês em frasco hermético. Mas há um truque: “Os testes no texturômetro (equipamento que mede as propriedades físicas) revelaram que as maçãs devem ser retiradas do “Sun2Dry” e devem arrefecer durante alguns minutos à temperatura ambiente, antes de serem guardadas, para preservar a sua crocância”, acrescenta.
O protótipo já se mostrou eficaz na desidratação de outros produtos, tendo mesmo sido publicado, a 13 de setembro, o artigo científico “Effect of drying temperature and storage time on the crispiness of homemade apple snacks”, escrito pela investigadora em coautoria com José Fernandes, Fernando Nunes e Pedro Tavares. Apesar de ainda ter de ser sujeito a uma revisão completa por pares, o artigo foi aceite para publicação e a conclusão é perentória: “Podemos oferecer com confiança aos consumidores a melhor combinação de snacks estaladiços e saudáveis que satisfaçam as suas expetativas“. O protótipo foi também ele alvo dum outro artigo científico, “Design of a Friendly Solar Food Dryer for Domestic Over-Production”, publicado em 2022 em coautoria pela investigadora com José Fernandes e Pedro Tavares, tendo-se concluído que, “utilizando materiais de baixo custo e reutilizados, é possível projetar e construir protótipos de desidratadores solares não poluentes e baratos”. O equipamento foi apresentado também na 18.ª edição da International Conference on Alternative Materials”, em Londres.
E quais os próximos passos? “Testagem e a avaliação dos snacks obtidos, bem como a comparação com os produzidos em desidratadores elétricos e comerciais”, acrescenta a investigadora, que reforça que “com o Sun2Dry, podemos promover hábitos nutricionais saudáveis, energia limpa e prevenção do desperdício”.